Com menos aliados e sob o risco de ficar sem Lula, PT faz ofensiva por apoio popular

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A notícia desta semana de que o ex-presidente Lula será julgado no dia 24 de janeiro pelo Tribunal Regional Eleitoral da 4ª Região (TRF4), em segunda instância, derrubou o ânimo de petistas graúdos. A possibilidade de Lula se tornar inelegível oito meses antes da eleição, balançou as estruturas no partido que já vinha empregando esforços para reorganizar-se depois do caos que começou em 2014, com a Lava Jato. Se por um lado o seu possível candidato tem a maior preferência entre os eleitores, por outro pode ser impossibilitado de seguir adiante. Antes desta batalha, porém, a legenda entrava na disputa por 2018 sob um desalento que antecedia a eventual saída de seu protagonista. As alianças partidárias que deram sustentação à legenda nas últimas eleições minguaram, com a saída, inclusive, do sempre aliado PCdoB. E o suporte nas ruas quase desapareceu ao longo dos anos em que o Governo esteve em mãos petistas, com a ida de importantes quadros de articulação para a administração do país e a insatisfação dos movimentos sociais e da militância com algumas das políticas adotadas neste período. Sabendo da dificuldade de se reconquistar aliados, já que muitos dos antigos correligionários se juntaram ao atual Governo, o partido foca em tentar recuperar militantes.

Nos últimos meses, o PT já tentava se reaproximar das ruas, com uma nova campanha de filiação, a mudança dos quadros que fazem o contato com os grupos e a tentativa de organização em segmentos em que antes não eram organizados, como os evangélicos. Nesta sexta dia 15, por exemplo, o partido lançou um grupo de comitês populares para articular movimentos sociais, sindicais e a militância petista pela defesa da candidatura de Lula nas ruas. “Estamos a favor da democracia. Estamos com Lula”.

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Depois de o TRF-4 ter marcado a data do julgamento de Lula — o ex-presidente prometeu nesta quarta “brigar até as últimas consequências”.  “Queremos iniciar uma campanha massiva, de criação de comitês populares, por local de trabalho, em defesa do direito de Lula ser candidato à presidente da República”, explica o texto de lançamento da iniciativa, assinado pela atual presidenta da sigla, a senadora Gleisi Hoffmann, e pelo secretário de Movimentos Populares e Políticas Setoriais do PT, Ivan Alex Lima.

No final de setembro, o partido também renovou a liderança de suas 27 secretarias setoriais, que funcionam como coordenadorias temáticas que lidam com grupos específicos, como cultura, juventude, combate ao racismo. E, com o afastamento do poder, nomes estrelados acabaram responsáveis por alguns destes núcleos, como é o caso do ex-ministro do Desenvolvimento Agrário na última gestão de Rousseff, Patrus Ananias, que assumiu a Secretaria Setorial Nacional Agrária do PT, responsável pelas propostas do partido para este segmento.

“Há quatro anos a gente não fazia este tipo de renovação”, explica Gleisi Hoffmann. “De fato, houve um pouco de afastamento entre os movimentos sociais e o PT nos últimos anos com a presença do partido no Governo e queremos reforçar essa nossa proximidade”, reconhece ela, que pondera que isso não quer dizer que a legenda tenha se “distanciado” destes grupos, pois “muitas das políticas públicas foram planejadas em cima das demandas dos movimentos sociais”. Mas o próprio ex-presidente Lula já havia reconhecido o problema no aniversário de 35 anos do PT, no início de 2015: “O exercício do poder acaba fragilizando um partido”, afirmou, na ocasião, cerca de um ano antes de Dilma Rousseff sofrer o impeachment que alijou o partido do poder federal, local que ocupava havia 13 anos. “[Os militantes] ao invés de irem para a porta da fábrica, foram para repartições públicas”, destacou ele.

“A direção do PT ficou quatro anos sem falar com o MST [Movimento dos Sem-Terra] nos últimos períodos do Governo Lula. A gente simplesmente não conseguia falar com o presidente”, explica o agricultor João Paulo Rodrigues, coordenador nacional do movimento, um dos mais próximos ao partido antes de a legenda assumir o poder.  “Quando o PT estava na Presidência houve muita oscilação política em relação aos movimentos sociais. O partido fez alianças críticas, com pessoas como o [José] Sarney, com setores do agronegócio”, explica ele, que reconhece que, agora, o movimento volta a se aproximar. “Os golpistas querem tirar o direito de Lula ser candidato. Temos problemas maiores. Quando se está perdendo tem que se unir. O Lula tem que ser candidato, mas isso não significa que vamos apoiar necessariamente os governadores e prefeitos do PT”, pondera ele, que promete que o MST colocará a militância na rua em apoio ao ex-presidente.

“A realidade se transformou. E as bases políticas que formavam aquela aliança que levou o PT ao poder já não existem mais naquele formato. Essas bases agora terão que ser outras”, afirma Ricardo Gebrin, um dos diretores nacionais da Consulta Popular, grupo que reúne militantes de diversos movimentos de esquerda que também realizou críticas públicas ao Partido dos Trabalhadores nos últimos anos, mas recentemente declarou apoio a Lula. “Temos elementos de crítica no que foram as experiências de Governo petistas. Elas trouxeram lacunas importantes, como a falta de organização popular ou não ter buscado caminhos para romper com o sistema político vigente”, diz ele. “Mas o candidato Lula transcende o PT. É um elemento contra o golpe, um símbolo da esperança e que tem potencial político. Temos que apostar nesta aproximação com os movimentos”, explica.

Para o coordenador da secretaria do partido que faz a interlocução com os movimentos populares, Ivan Alex Lima, o PT agora se volta ao que fez em sua construção, na década de 80. “Se vamos apresentar um novo programa agrário para as eleições não temos como não ouvir os movimentos agrários”, explica ele. “O mesmo acontece na educação, na mídia… Se olharmos os últimos 10 anos, essa não foi a chave. Quando se chega ao Governo há esse efeito colateral em que a burocracia ganha força.”

Evangélicos

Diante da falta de apoio iminente de líderes evangélicos a uma candidatura lulista, o PT também tem buscado se organizar na base desta religião, que já aglutina 32% da população, segundo pesquisa Datafolha. A responsável pelo trabalho é a deputada federal Benedita da Silva, evangélica pentecostal, que tem organizado os militantes e simpatizantes petistas em torno da causa. Ela nega, entretanto, que isso esteja sendo feito por interesse eleitoral. “O PT tem muitos evangélicos e me incomoda muito quando dizem que somos todos iguais”, explica ela, que diz ser contrária a postura de parlamentares evangélicos conservadores de dificultar a união de casais do mesmo sexo e do acesso ao aborto em caso de estupro, algo já garantido pela legislação. “Estamos relendo os nossos princípios como evangélicos e dando contribuições de forma partidária. Discutindo, por exemplo, o que significa para nós o acesso à terra, à educação, à saúde. Não posso, por exemplo, ser a favor desta reforma da Previdência se minha fé diz que é um dever da gente cuidar dos nossos idosos, das nossas viúvas”.  

Segundo ela, será lançado um manifesto nos próximos meses e haverá um encontro nacional só dos petistas evangélicos. “O partido nunca se preocupou muito com essa questão. Mas nossa preocupação não é a de buscar evangélicos para o PT. Sentimos que é nosso dever demonstrar para o povo as várias visões que os evangélicos têm. Precisamos reagir diante das coisas escabrosas que estão acontecendo”, explica. “É um debate muito sério, rico e humano. Estamos fazendo a discussão. É claro que se as pessoas quiserem vir conosco, ótimo!”

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